O infectologista Dr. Renato Grinbaum*, docente do curso de Medicina da Universidade Cidade de São Paulo (Unicid), instituição que integra a Cruzeiro do Sul Educacional, avalia os aspectos clínicos do coronavírus e explica como são os processos desde a infecção pelo vírus, como a covid-19 age nas células, quais os aspectos de recepção e como se dão as mutações do vírus, além de avaliar as manifestações das variantes e as formas eficazes de tratamento. Confira:
A INFECÇÃO
Segundo o especialista, trata-se de um vírus de pouca complexidade, estruturado a partir da proteína S (Spike), com duas formas de infecção, a leve e a severa. A forma severa é dividida ainda em duas fases, sendo a primeira, com manifestação de cinco a sete dias, com uma grande quantidade de vírus circulantes, em que o paciente apresenta sintomas de baixa intensidade, sintomas que desaparecem em aproximadamente 85% das pessoas. Entre 15 a 20% desses pacientes, a partir do quinto ao sétimo dia até o 14º, há o recrudescimento desses sintomas, fase em que o paciente começa a sentir os problemas mais temidos, como: dispneia, sepse, com possível necessidade de UTI.
O especialista explica que para essa primeira fase não existe tratamento disponível. “Nós não temos nenhuma droga que seja verdadeiramente eficaz. Há um estudo sobre a ivermectina, por exemplo, que é o estudo mais conclusivo, o qual mostra que não há benefício clínico em termos de diminuição de mortalidade e de eventos severos, e o mesmo ocorre para outras drogas”, explica Grinbaum.
Do ponto de vista clínico, o infectologista argumenta que diante da evolução de sintomas no paciente, a partir de alguns fatores imunológicos, é possível realizar algumas intervenções que são consideradas eficazes, como o uso de imunoglobulina rica em IgM precocemente, corticoides, como o dexametasona ou o metilprednisolona, e mais recentemente, o tocilizumabe, como uma alternativa segura e que diminui o risco de intubação e o tempo de internação.
“As intervenções são: observação na fase inicial, monitorização clínica e de exames laboratoriais, e a partir do momento que se tem uma deterioração laboratorial que antecede a deterioração clínica, é possível realizar essas intervenções e de imunomodulação, a qual procuramos deter a atividade do sistema imune inato”, explica.
RECEPTORES E SEVERIDADE
Diante da dinâmica da imunologia da doença, Grinbaum destaca que quem conhece sepse, inclusive sepse bacteriana, conhece covid e que o conhecimento de imunologia da patogênese da sepse foi crucial para o enfretamento da doença.
“Quando um invasor chega no organismo, vários sistemas o reconhecem, e uma resposta imunológica é liberada, como citocinas específicas para esse agente. Um dos sistemas mais importantes é o toll-like receptors (TLR), que sinaliza para as células se protegerem desse invasor. Entre os vários problemas que ocorrem com a covid severa, é que aproximadamente 10% dos pacientes desenvolvem anticorpos cod terfero 1, e reconhecem de forma menos eficaz ou mais lenta, esse vírus. O principal fator que leva à severidade, é a ligação do vírus, que ao entrar na célula, exerce o seu efeito e infundir o seu material genético, causando infecção, através da proteína S, que se liga “batendo” em um receptor de membrana”, esclarece o infectologista.
Outro ponto levantado pelo médico, é que em indivíduos com comorbidades, o vírus tem uma facilidade em adentrar às células, pois esses indivíduos têm uma alta expressão de Enzima conversora da angiotensina 2 (ECA2). “O ECA2 está envolvido em uma séria de processos fisiológicos, e quando o vírus se liga ao ECA2, ele faz uma regulação negativa desse receptor e tem a sua ação inibida. Isso leva a vários efeitos, como vasoconstrições, fibrose, trombose, entre outras reações. É uma infecção sistêmica.
VARIANTES
Sobre variantes, o infectologista explica que elas são fenômenos naturais, e que todos os seres vivos dispõem de variantes, pois possuem variações genéticas acumuladas a partir de muitas gerações.
“A diversidade é a origem da vida. O ser humano é muito complexo, com uma mutação pouco perceptível, e o vírus, que é menos complexo, dispõe de mutações que mudam expressivamente. Em relação ao coronavírus, somos nós quem desenvolvemos uma seleção artificial. Isso ocorre com todos os patógenos. Os organismos muito complexos têm mais dificuldades para produzirem variantes. Quanto mais deixamos o vírus replicar, mais chance tem de uma variante aparecer, isto é, quanto mais gente replicar e demorarmos para ações efetivas para conter a pandemia, mais variantes teremos. Precisamos fazer a lição de casa. A principal causa de transmissão é a partir das vias respiratória, com a aproximação entre pessoas”, ressalta.
Por fim, Grinbaum avalia que no Brasil, há uma combinação perigosa, com um nível de transmissão alto, grande número de contaminados e frequência de mutações elevadas, combinadas ainda com uma taxa lenta de vacinação e contaminados que infectam pessoas já vacinadas, e disso surgem as variantes.
“As variantes do Sars-CoV2 são inúmeras. As mutações conferem em vantagem seletiva e a principal se dá quando se altera a proteína de ligação, como citado no ECA2. Não há diferenciação de gravidade entre países, que existe, é uma detecção maior entre alguns países e outros, devido ao maior ou menor grau de investimento em ciência, por exemplo”.
Variantes de interesse: com marcadores genéticos que indicam alteração em receptores de ligação, neutralização por anticorpos reduzida, diminuição da eficácia terapêutica, impacto diagnóstico ou potenciais aumento da transmissibilidade ou patogenicidade. Portanto, as mutações ocorrem na proteína S.
Variantes preocupantes: variantes com evidência demonstrada de aumento de patogenicidade, transmissibilidade, redução de resposta vacinal ou prejuízo nos exames diagnósticos. Basicamente são cinco variantes classificadas como preocupantes e como várias mutações. As principais são: a variante britânica, a sul-africana e a brasileira-japonesa.
“Os cuidados ainda são o distanciamento social e a higienização frequente das mãos”, finaliza.
*Dr. Renato Grinbaum atua como médico infectologista. Doutorado em Clínica Médica. Atualmente é Professor da Universidade Cidade de São Paulo.