Os resultados finais do ensaio clínico de fase 3 da vacina contra a chikungunya (VLA1553), desenvolvida em parceria entre o Instituto Butantan e a empresa de biotecnologia franco-austríaca Valneva, mostraram que a imunogenicidade alcançada após a vacinação permaneceu por ao menos seis meses, com manutenção da produção de anticorpos durante esse período em 96,3% dos indivíduos avaliados. Além disso, o imunizante é seguro e causa reações adversas mínimas.
O estudo foi conduzido nos Estados Unidos com 4.115 homens e mulheres acima de 18 anos. Inicialmente, a taxa de soroconversão da vacina foi de 98,9% tanto para adultos quanto para idosos acima de 65 anos, promovendo níveis semelhantes de anticorpos neutralizantes. Passados seis meses da aplicação da vacina, a soroconversão continuou elevada, sendo detectada em 96,3% dos participantes da pesquisa. A duração da imunidade continuará sendo monitorada periodicamente com testes sorológicos durante pelo menos cinco anos.
O indicador é representativo porque os Estados Unidos, onde foi realizado o ensaio clínico, não são uma região endêmica de chikungunya. Ou seja, a presença de anticorpos neutralizantes se manteve alta após a vacinação em um ambiente no qual os voluntários não ficam em contato constante com o vírus – a tendência é que em locais onde a doença é endêmica, a produção de anticorpos seja ainda maior.
O chefe médico da Valneva, Juan Carlos Jaramillo, diz que o estudo confirma a segurança, tolerabilidade e imunogenicidade da vacina em adultos e idosos. “Entregar pela primeira vez os resultados finais de fase 3 de uma vacina contra chikungunya significa que estamos um passo mais próximos de solucionar uma importante e crescente ameaça de saúde pública”, afirma.
A avaliação de segurança foi feita com 3.082 voluntários e a maior parte das reações adversas relatadas foram leves a moderadas. Cerca de 50% dos participantes apresentaram reações sistêmicas como dor de cabeça, fadiga e dor no local da injeção, que se resolveram em poucos dias. Apenas 2% dos participantes reportaram efeitos mais severos, sendo febre o mais comum.
A imunogenicidade e segurança da VLA1553 já haviam sido demonstradas em ensaios clínicos de fase 1 e 2 em 2018, feitos com 120 pessoas de 18 a 45 anos que nunca tiveram contato com o vírus chikungunya. Após 14 dias da dose única, houve 100% de soroconversão e os anticorpos foram mantidos mesmo depois de um ano. Não foi registrado nenhum evento adverso grave até um ano após a aplicação.
Eficácia da vacina será avaliada em adolescentes brasileiros
Ensaios clínicos com a vacina da chikungunya também estão sendo realizados no Brasil. O objetivo é avaliar a vacina em uma região endêmica da doença, algo fundamental para atestar a real eficácia de um imunizante. O estudo terá duração de 15 meses e será feito com 750 voluntários, todos adolescentes de 12 a 17 anos. No final de janeiro, o Butantan iniciou o ensaio clínico em São José do Rio Preto. Também participarão do estudo centros de pesquisa de São Paulo-SP, Salvador-BA, Fortaleza-CE, Belo Horizonte-MG, Aracaju-SE e Campo Grande-MS.
Para o gerente de parcerias estratégicas e novos negócios do Butantan, Tiago Rocca, os resultados de segurança e manutenção de seis meses da imunogenicidade em adultos dos Estados Unidos trazem ainda mais segurança para os adolescentes brasileiros que participarão do estudo. “Os dados trazem uma confiança maior de que estamos no caminho certo e teremos uma vacina em breve”, afirma.
Para se inscrever em São José do Rio Preto, é preciso ser morador da região e enviar um e-mail para chikv.sjrp@gmail.com manifestando o interesse em se tornar voluntário do ensaio clínico ou se preencher o formulário no site do Centro Integrado de Pesquisa – Hospital de Base de São José do Rio Preto, onde será realizada a pesquisa.
Combate à doença no Brasil e em países emergentes
Segundo Tiago, a missão do Butantan na parceria com a Valneva é fazer a transferência de tecnologia para a produção e distribuição nacional da vacina contra a chikungunya e distribuir o imunizante para países de baixa e média renda que também são afetados pela doença, como os da América Latina, Ásia e África.
“Como premissa de negócios, o Butantan tinha interesse de não só trazer a vacina para o Brasil, mas também ter a tecnologia produtiva e colaborar com o desenvolvimento do produto, assim como fizemos com a vacina da dengue e a própria CoronaVac. O Instituto tem uma perspectiva maior de atender grandes populações em países emergentes”, diz.
Sobre a chikungunya
A chikungunya é uma doença infecciosa causada pelo vírus de mesmo nome que pode ser transmitida pelos mosquitos Aedes aegypti e Aedes albopictus (mesmos mosquitos que transmitem a dengue e a febre amarela, respectivamente). Os sintomas incluem febre acima de 38,5°C, de início repentino, e dores intensas nas articulações dos pés e mãos, além de dor de cabeça, nos músculos e manchas vermelhas na pele. Cerca de 30% dos casos são assintomáticos.
A circulação do vírus foi identificada no Brasil pela primeira vez em 2014 e ele já está presente em mais de 120 países. Como a transmissão ocorre por mosquitos, é fundamental reforçar as medidas de eliminação dos criadouros de mosquitos nas residências. As recomendações são as mesmas aplicadas à prevenção da dengue.